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    Por que as vacinas salvam vidas?

    A imunização coletiva é a forma mais eficiente de prevenir doenças e evitar mortes

    Por Samantha CerquetaniPublicado em 25/04/2022, às 19:25 - Atualizado em 25/05/2023, às 13:58
    Foto: Shutterstock

    Nunca falamos tanto em vacinas como nos últimos anos. Mas, por acaso, você já parou para pensar como seria a nossa vida sem elas? Com a covid-19, conseguimos entender que a vacinação funciona como um “pacto coletivo” capaz de mudar o curso da história.

    Ao longo dos séculos, as vacinas contribuíram com a diminuição da mortalidade infantil e também com o aumento da expectativa de vida. Hoje sabemos a importância de manter o calendário vacinal em dia para prevenir diversas doenças desde o nascimento. Porém, nem sempre foi assim.

    Como tudo começou

    De acordo com o CDC (Centro de Controle e Prevenção de Doenças), desde o Antigo Egito já se faziam experimentos para controlar o vírus da varíola. Naquela época, a ação precursora da vacinação era coletar o material das feridas causadas pela doença e esfregá-lo no braço ou inalá-lo pelo nariz. Essa técnica, apesar de desagradável e precária, era capaz de reduzir a contaminação pela doença, mas não era suficiente  para evitar os surtos epidêmicos.

    A primeira vacina contra a varíola foi criada em 1796 pelo médico inglês Edward Jenner. Para isso, ele extraiu uma lesão de varíola bovina de uma mulher e “contaminou” um menino de 8 anos. A cepa de varíola bovina desencadeou uma defesa no sistema imunológico do garoto. A partir daí, seu método passou por diversas mudanças tecnológicas e científicas que permitiram a erradicação da varíola.

    Apesar desse avanço, os cientistas perceberam que desenvolver uma vacina não era algo tão simples: qualquer alteração poderia tornar a vacinação ineficaz e, em casos mais graves, poderia levar a eventos adversos graves. Por isso, foram necessárias diversas pesquisas em todo o mundo para garantir que a vacina aplicada hoje no seu braço seja segura!

    “Desde então, o mundo evoluiu e segue aprimorando e criando técnicas de imunização para diferentes agentes (vírus e bactérias) capazes de induzir  a criação de anticorpos, evitando que a pessoa imunizada desenvolva a doença em si”, explica Igor Brasil Brandão, infectologista e Coordenador do Serviço de Controle Hospitalar da Bahia.

    Infográfico: Alessandro Datcho

    Por que precisamos nos vacinar?

    Como você viu, não foi fácil chegar até aqui. Milhares de cientistas do mundo inteiro dedicaram anos de suas vidas pesquisando a eficácia e a segurança das vacinas para a humanidade.  No entanto, você sabe por que precisamos nos vacinar?

    “A vacinação é uma maneira segura de prevenir doenças. A pessoa que é imunizada diminui o risco de adoecimento e de se apresentar manifestações graves. Sem a vacinação, podemos ter de volta doenças que já foram eliminadas”, destaca Maria Isabel de Moraes Pinto, infectologista, professora da Universidade Federal de São Paulo e consultora em vacinas da Dasa.

    Aqui, cabe explicar a diferença entre os termos vacinação e imunização. Apesar de parecerem a mesma coisa, o primeiro significa o ato de aplicar a vacina; já a imunização é o desenvolvimento de anticorpos específicos derivados da vacina aplicada.

    Por isso, quanto mais pessoas são vacinadas, menor é a circulação de vírus e bactérias entre a população. E assim menos pessoas adoecem. De acordo com a OMS (Organização Mundial de Saúde) cerca de 2 a 3 milhões de mortes a cada ano são evitadas devido à vacinação.

    Como vacinas funcionam no organismo

    As vacinas são como um campo de treinamento para o sistema imunológico. Por isso, ela pode fornecer ao organismo o poder de estabelecer uma resposta mais rápida a doenças que, muitas vezes, seriam mortais.

    Veja, a seguir, detalhes de como elas atuam no nosso corpo:

    Infográfico: Alessandro Datcho. Fonte: CDC

    Como uma vacina é produzida?

    Você já contou quantas vacinas recebeu na vida? Até que elas sejam liberadas para a população, é necessário utilizar diferentes tipos de tecnologia.

    Infográfico: Alessandro Datcho

    COMPOSIÇÃO DA VACINA

    Infográfico: Alessandro Datcho

    Um longo caminho até a imunização

    Até a vacina poder ser distribuída e administrada à população, ela passa por diversas etapas que garantem a sua segurança. Quando a vacinação ocorre de fato, os cientistas e pesquisadores já se asseguraram de que a imunização não irá causar danos graves para os indivíduos.

    No Brasil, por exemplo, toda vacina para ser licenciada precisa ser avaliada e aprovada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). O órgão analisa de forma bastante rigorosa estes imunobiológicos.

    Veja abaixo detalhes de como são as fases de aprovação de uma vacina pela Anvisa. Vale destacar que, fora de uma situação de pandemia, por exemplo, as vacinas precisam ter uma eficácia acima de 70%.

    Infográfico: Alessandro Datcho

    Brasil: de referência mundial até a queda da cobertura vacinal

    A história da imunização no Brasil começa em 1904 quando a vacinação contra a varíola se tornou obrigatória. No entanto, apenas em 1973 foi criado o Programa Nacional de Imunização (PNI) e o SUS (Sistema Único de Saúde), a partir de 1988, passou a oferecer vacinas de forma integral para toda a população.

    Com a ampla cobertura vacinal, o Brasil reduziu o número de casos e a mortalidade por doenças como tétano, difteria, pneumonia e meningite, além de eliminar o risco de tétano neonatal, poliomielite e rubéola congênita.

    Por muitas décadas, as políticas públicas de imunização brasileira já foram consideradas referência mundial. O PNI, por exemplo, é um dos maiores programas de vacinação do mundo.

    Mesmo assim, a busca pelas vacinas vem caindo nos últimos anos. Desde 2016, há uma queda na cobertura vacinal, que piorou com a pandemia.

    De acordo com Renato Kfouri, pediatra, infectologista e diretor da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), as causas são multifatoriais. “Podemos afirmar que há muita imprecisão nos dados, mas sabemos que a baixa percepção do risco das doenças e as dificuldades para se chegar aos postos de saúde são algumas razões para a queda da cobertura vacinal”, afirma.

    Além disso, a vacinação ganhou um novo obstáculo: as fake news. A disseminação de notícias falsas sobre imunizantes compromete bastante a cobertura vacinal. Surgiram diversos boatos sobre a segurança e a eficácia das vacinas, o que minou a confiança das pessoas. Muitos pais começaram a se questionar se as crianças realmente deveriam ser imunizadas.

    Outra notícia falsa que circulou bastante era a de que as vacinas provocavam autismo. Esse mito surgiu principalmente em relação à tríplice viral (contra sarampo, rubéola e caxumba). Um dos motivos é que o Transtorno do Espectro do Autismo costuma ser diagnosticado quando a criança está com cerca de 18 meses, ou seja, está sendo imunizada.

    Diversas pesquisas foram realizadas em todo o mundo e até o momento não há evidências científicas que relacionem a imunização com o autismo. Vale destacar que o TEA é considerado um transtorno de neurodesenvolvimento, ou seja, se apresenta no início do período de desenvolvimento cerebral da pessoa.

    Mas será que deixar as vacinas de lado oferecem riscos? Sim! Para os especialistas, abandonar a imunização deixa a população mais suscetíveis a doenças contagiosas, que já tinham sido eliminadas ou circulavam pouco no Brasil.

    “Com a imunização, as pessoas começaram a hesitar em se vacinar ao acharem que não há mais riscos de contaminação. Mas estamos vendo que doenças erradicadas, como o sarampo, estão voltando, justamente pela diminuição da cobertura vacinal”, destaca Moraes Pinto.

    “Por não ter sido vacinada na infância, tenho várias sequelas da pólio”

     

    Em 1995, Arlete Nascimento, 53, passeava com o noivo no Memorial da América Latina (SP) quando sentiu uma dor no pé. Ao procurar o médico, ela descobriu que o membro estava entortando e precisava de cirurgia.

    A professora não tinha ideia de que era um sinal da síndrome pós-pólio (SPP). A condição afeta pessoas que tiveram poliomielite muitos anos depois da doença aguda.

    “Eu não fui vacinada na infância e não sei quando tive a pólio. Sei que andei aos 4 anos.  Meus pais se separaram, morei um tempo com a minha avó e em um orfanato em Tiradentes (MG). Não tive sequelas físicas aparentes, mancava um pouco, mas tinha uma vida normal”.

    Com o tempo, o desconforto no pé foi aumentando. Mesmo buscando ajuda médica, ela não sabia o que causava a dor. O diagnóstico de SPP veio apenas em 2013. “Tinha muita fraqueza muscular, fiz uma cirurgia na coluna, duas no pé, tenho dificuldades para respirar e hoje sou cadeirante”, acrescenta.

    Como ainda sente muitas dores no pé, Arlete se prepara para mais uma intervenção cirúrgica. “Tem dias que pentear o cabelo já é uma grande dificuldade. É preciso a conscientização dos pais. Não é algo distante. A poliomielite pode voltar e uma gotinha pode evitar tudo isso”, finaliza.

    O que vem por aí!

    Durante a pandemia, milhares de cientistas do mundo inteiro buscavam um imunizante para reduzir os casos graves e mortes por covid-19. Como legado desses anos difíceis, entraram em cena as vacinas que utilizam a tecnologia de RNA mensageiro (ou mRNA).

    VacinaçãoFoto: Shutterstock

    Para desencadear uma resposta imune, o mRNA ensina nossas células a produzir uma proteína (ou um pedaço dela) para desenvolver uma resposta imune dentro do corpo. Isso produz anticorpos e nos protege do vírus.

    No final de 2020, a Food and Drugs Administration (FDA) nos Estados Unidos aprovou a primeira vacina de mRNA para uso em humanos, a Pfizer-BioNTech contra a covid-19, que apresentou uma taxa de eficácia de 95%  nos ensaios clínicos.

    Mais recentemente, no final de 2021, a farmacêutica Moderna anunciou o desenvolvimento da vacina trivalente contra a gripe, covid-19 e RSV (vírus sincicial respiratório) utilizando a tecnologia de mRNA. Atualmente, são realizadas pesquisas usando a mesma tecnologia para combater herpes genital, herpes-zóster e câncer.

    “Produzir sinteticamente parte do código de informação genética do vírus foi uma grande conquista. Essas vacinas estimulam mais o sistema imunológico e podem proteger mais o organismo”, afirma Kfouri.

    E as novidades não param por aí! Você já se perguntou se existe alguma previsão para vacinas contra doenças com que lutamos há décadas como a Aids ou até mesmo o câncer? Sim, já existem pesquisas avançadas no assunto.

    No caso do câncer, as vacinas treinam o sistema imunológico para produzir anticorpos e células para combater as células cancerosas, agredindo diretamente os tumores. Vale destacar que os estudos ainda estão em andamento.

    No momento, dezenas de ensaios clínicos estão testando vacinas com a tecnologia de mRNA em pessoas com vários tipos de câncer, incluindo o de pâncreas, colorretal e melanoma. Além disso, algumas vacinas estão sendo avaliadas em combinação com medicamentos para melhorar a resposta imune do organismo aos tumores.

    Além disso, em janeiro de 2022, a Moderna também anunciou uma vacina experimental contra o HIV, que foi aplicada nos primeiros voluntários. Chamado de IAVI G002, o teste fornece antígenos específicos do HIV ao corpo e induz uma resposta imune.

    “A expectativa da vacina contra o HIV é muito grande tanto para pacientes quanto para os médicos. Infelizmente, ainda não há uma previsão de quando isso será possível, mas as pesquisas mostram que estamos mais próximas dessa realidade. As vacinas são importantes para que possamos prevenir a infecção”, afirma Gisele Gosuen, infectologista e responsável pelo Ambulatório de HIV e Envelhecer, da EPM-Unifesp (Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo).

    Foto: Shutterstock

    Vacinas mais eficientes

    A vacina de aplicação nasal em spray contra a covid-19 já é uma realidade e pode estar disponível para a população em breve. Pesquisadores do Laboratório de Imunologia do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo) estão desenvolvendo um imunizante que promete prevenir a infecção, bloqueando o vírus em seu ponto de entrada: as mucosas do nariz e boca.

    Acredita-se que a imunização nasal diminua a transmissão do vírus e contribuir para o fim da pandemia no mundo. Isso poderá se tornar realidade por meio da redução do número de casos ao impedir que a infecção seja transmitida de uma pessoa para outra.

    Para Moraes-Pinto, com a tecnologia e os avanços nas pesquisas,  é possível que as vacinas sejam produzidas de uma forma cada vez mais rápida e segura. “Na medida que formos adquirindo expertise em vacinas, a população  ficará mais protegida. Nesse cenário, os profissionais de saúde são fundamentais para disseminar informações corretas sobre a imunização e esclarecer as dúvidas que possam surgir”, conclui.

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